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Família – A Conexão da Família – Parte 02/02

Família na visão cristã

II. Deus estabelece propósitos para a família

Gênesis revela que Deus estabeleceu a família com quatro propósitos definidos.

A partir do v. 18, verificamos que Deus criou a família para atender quatro necessidades humanas importantes: (1) Deus criou a família para prover nossa necessidade de ajuda e correspondência (v.18-20); (2) Deus criou a família para prover desfrute de amor conjugal (v. 21-24); (3) Deus criou a família para prover o cuidado e a formação dos filhos (v. 24); (4) Deus criou a família para prover relações sinceras e honestas (v. 25).

[1] Quanto à necessidade de ajuda e correspondência, lemos no v. 18 que: “Disse mais o SENHOR Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora [Almeida Revista e Corrigida, ARC: ‘adjutora’; King James Atualizada, KJA: “alguém que o ajude”; Nova Versão InternacionaI, NVI: “alguém que o auxilie”] que lhe seja idônea” (Gn 2.18).

É muito comum usar Gênesis 2.18 para ensinar a doutrina da submissão feminina, mas a ênfase do texto é a seguinte: a solidão não é boa nem bela. Adão não deu conta da vida sozinho. Ele precisou de “auxílio” [ʿēʹ·zěr], “ajuda” ou “socorro”, assim como Israel: “Tomou, então, Samuel uma pedra, e a pôs entre Mispa e Sem, e lhe chamou Ebenézer, e disse: Até aqui nos ajudou o SENHOR” (1Sm 7.12). Israel precisou do socorro do SENHOR. Adão também precisou do socorro do SENHOR. O socorro do SENHOR para Adão foi Eva. Daí a ARC: “farlhe-ei uma adjutora”. E a KJA: “farei para ele alguém que o ajude”.

E a NVI: “farei para ele alguém que o auxilie”. A necessidade de correspondência aparece em dois lugares, nos v.18 e 20. No primeiro, lemos que falta a Adão uma pessoa “que lhe seja idônea”. A ARC traduz: “far-lhe-ei uma adjutora que esteja como diante dele”. Ser idôneo ou “estar diante de” tem o sentido de “ser semelhante a ele” (Nova Almeida Atualizada, NAA) ou “corresponder a ele” (KJA, NVI). O sentido primário é: Adão era o único de sua espécie; não havia alguém semelhante a ele.

Sob esta ótica, a narrativa dos v. 19-20 — a tarefa de dar nomes aos animais e aves — parece destacar isto: faltava quem correspondesse a Adão: “para o homem, todavia, não se achava uma auxiliadora que lhe fosse idônea” (v. 20). A ideia de correspondência aparecerá  novamente no v. 23, por ora, basta entender que Adão foi feito capaz de amar a Deus e a outras pessoas. Mas não havia ninguém “diante dele”, “semelhante a ele”, a quem ele pudesse expressar amor e ser correspondido.

Deus criou a família para prover nossa necessidade de ajuda e correspondência. A família existe para que seus membros ajudem ou socorram uns aos outros neste mundo.

[2] Quanto à necessidade de desfrute do amor conjugal, os v. 21-22 trazem o texto em prosa, narrando a providência divina para resolver o problema apontado no v. 18.

                             Então, o SENHOR Deus fez cair pesado sono sobre o
homem, e este adormeceu; tomou uma das suas costelas e
fechou o lugar com carne. E a costela que o SENHOR Deus
tomara ao homem, transformou-a numa mulher e lha trouxe (Gn 2.21-22)

Existem muitas observações possíveis sobre estes versículos, mas o importante para nós, agora, é sublinhar três coisas.
(1) Gênesis 1.27 diz que Deus criou “homem e mulher”, ao passo que Gênesis 2 relata primeiro a criação do homem (v. 7) e depois, a criação da mulher (v. 21-22).
(2) O texto informa que Adão e Eva são semelhantes. Como afirmao irmão Sidney Greidanus

O uso de uma parte do homem para criar a mulher não
deixa a menor dúvida de que a mulher está no mesmo
nível de Adão. O comprometimento e a dependência
mútuos têm de ser total.5

5 GREIDANUS, Sidney. Pregando Cristo a Partir de Gênesis. São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 99. Cf. FRANCISCO, Clyde T. “Gênesis”. In: ALLEN, Clifton J. (Org.). Comentário Bíblico

(3) Depois de criar a mulher, Deus “lha trouxe” (v. 22), ou seja, Deus conduziu a mulher a Adão. Por esta razão os intérpretes gregos sugeriam que Deus foi o primeiro ninfagogo, sendo que, ninfagogo era quem, na Grécia antiga, conduzia a noiva para a casa do esposo.

6Esta é a origem do costume atual, do pai acompanhar a noiva até entregá-la ao noivo, na cerimônia de casamento.
Notemos que estas são provisões divinas para a vida afetiva e conjugal. Isso fica mais claro no v. 23, que abandona a forma de prosa e, no texto original, aparece como uma poesia. Percebamos que esta é primeira palavra do homem na Bíblia.

23a E disse o homem:
Esta, afinal, é osso dos meus ossos
e carne da minha carne.

O tom do poema é festivo: começa com “esta, afinal!” (ARA, NAA)ou “esta, sim!” (KJA, NVI) ou “até que enfim!” (Bíblia A Mensagem), ou, conforme Clyde T. Francisco, “esta é ela!”7 ; melhor do que “esta é agora” (ARC). No hebraico, a poesia começa com “esta uma”, 8 comunicando a seguinte ideia: Deus não precisa ir adiante na busca
por uma companheira para ele. Adão está satisfeitíssimo com Eva.9 E o poema prossegue:

23b […] chamar-se-á varoa,
porquanto do varão foi tomada

Broadman: Velho Testamento. Rio de Janeiro: Junta de Educação Religiosa e Publicações, 1987, v. 1, p. 181: “Não se dá nenhum indício da inferioridade da mulher”.
6 MICHAELIS: DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA. Disponível em:
<https://michaelis.uol.com.br/palavra/la9ld/ninfagogo/>. Acesso em: 01 mai. 2021. VON
RAD, Gênesis, p. 82, “o próprio Deus, como pai da noiva, leva a mulher ao homem”, apud
KIDNER, Derek. Gênesis: Introdução e Comentário. 1ª ed. reimp. 1991. São Paulo: Mundo
Cristão; Vida Nova, 1979, p. 62. (Série Cultura Bíblica). 7 FRANCISCO, op. cit., loc. cit.
8 Ibid., loc. cit.
9 Ibidem

Depois de dar nomes a todos os outros seres, Adão finalmente pôde nomear sua querida esposa. Ele a chamou de “varoa”, e a palavra aqui [ʾiš·šā(h)] significa “mulher”; “esposa”. Isso é assim porque ela foi tirada do “varão” [ʾîš], que significa “homem”; “marido”. No hebraico, as letras que compõem a palavra “mulher” estão contidas dentro da palavra “homem”. Não apenas ela foi tirada dele, mas a designação dela também foi tirada da designação dele.
Daí o costume, no casamento cristão, da mulher receber parte do nome de seu marido (no Brasil, o sobrenome)

Este é o primeiro cântico de Gênesis e de toda a Bíblia. Nós podemos chamá-lo de O Cântico do Amor. O v. 24 explica que “por isso, deixa o homem pai e mãe e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne”. Na criação da mulher, dois são feitos de um. No casamento, dois se tornam um. Nestes v. 21-24, Deus cria a família
para prover desfrute de amor conjugal.

[3] Quanto à necessidade de cuidado e a formação dos filhos, o v. 24 informa que é no lar, junto de “pai e mãe”, que ocorre nutrição, que se recebe cuidado e instrução, que se estabelece o alicerce para que, no devido tempo, a vida adulta seja abraçada, e homem e mulher se mostrem prontos para o casamento ou a vida solteira adulta

[4] Quanto à necessidade de relações sinceras e honestas, o v. 25 informa sobre a intimidade perfeita entre “um e outro, o homem e sua mulher”, que “estavam nus e não se envergonhavam”. Não há constrangimento entre eles. Eles são o que são, um diante do outro. Isso vai além da intimidade sexual, até a interação honesta que existe dentro da família. A família foi criada para ser o espaço ou instância em que podemos ser quem somos, diante uns dos outros. Lugar de acolhimento, de mútua colaboração e aceitação, de amizade, intimidade e honestidade

Resumindo, Deus estabelece propósitos para a família. Deus constituiu a família para atender a quatro propósitos definidos, para prover nossa necessidade de ajuda e correspondência, para prover desfrute do amor conjugal, para prover o cuidado e a formação dos filhos e para prover relações sinceras e honestas

Havendo dito isto, nós podemos concluir.

Algumas considerações e aplicações finais

Vejamos que Deus estabelece mandatos e propósitos para a família. Ao proceder assim, Deus estabelece a ordem da vida para a família. Deus nos criou para conexões com ele, com outras pessoas e com o cosmos. E Deus informa sobre a ordem correta da vida, para que estas conexões funcionem bem.

A ordem de Gênesis 2 é a ordem da vida. Primeiro vem a conexão com Deus. Em seguida vem a conexão com o cônjuge e os filhos. E isso ecoa em outras partes da Escritura.

Confia no SENHOR e faze o bem; habita na terra e alimentate da verdade.

Agrada-te do SENHOR, e ele satisfará os
desejos do teu coração. Entrega o teu caminho ao SENHOR,
confia nele, e o mais ele fará (Sl 37.3-5)

                                Se o SENHOR não edificar a casa, em vão trabalham os
que a edificam; se o SENHOR não guardar a cidade, em
vão vigia a sentinela. Inútil vos será levantar de
madrugada, repousar tarde, comer o pão que
penosamente granjeastes; aos seus amados ele o dá
enquanto dormem (Sl 127.1-2)

Buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça,
e todas estas coisas vos serão acrescentadas (Mt 6.33).

Esta é a afirmação central de Gênesis 2.15-25. A ordem de Gênesis é a ordem da vida. Isso vale para todos nós. Jovens ou velhos.Solteiros, casados, divorciados ou viúvos.
Se a família for centrada nela mesma, o resultado será decepção. Se a família for centrada no ser de Deus, nos mandatos de Deus e nos propósitos de Deus, o resultado será bênção. A maior parte de nossos problemas decorre de desorganização de nossas prioridades; precisamos urgentemente ajustar o foco de nosso coração.

Deus criou a família como algo bom e belo. Nós podemos nos maravilhar e agradecer a Deus pela narrativa da criação de Gênesis 2.15-25. E investir em nosso relacionamento com Deus. E uns com os outros.

E podemos, ademais, acreditar que Deus, que criou a família, sabe do que nossa família precisa. Do que nós precisamos para aprender a viver em família. Não é preciso tatear no escuro. Há um ideal, um modelo da criação, para a família e para a vida. Nós precisamos de corações, casamentos e lares norteados e alinhados aos padrões do criador.

Por fim, Deus nos deu a igreja como família. E assim como famílias se sentam ao redor de mesas, nós também fazemos isso hoje. Os que são purificados no sangue de Jesus, os que creem unicamente nele para sua salvação, são feitos família dele. E participam desta mesa de pão e vinho. Supliquemos a Deus que nos abençoe. Vamos orar.

Referências bibliográficas

ALLEN, Clifton J. (Org.). Comentário Bíblico Broadman: Velho Testamento. Rio de Janeiro: Junta
de Educação Religiosa e Publicações, 1987, v. 1.
GREIDANUS, Sidney. Pregando Cristo a Partir de Gênesis. São Paulo: Cultura Cristã, 2009.
HARRIS, R. Laird; ARCHER JR., Gleason L.; WALTKE, Bruce K. (Org.). Dicionário
Internacional de Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1998.
KIDNER, Derek. Gênesis: Introdução e Comentário. 1ª ed. reimp. 1991. São Paulo: Mundo
Cristão; Vida Nova, 1979. (Série Cultura Bíblica).
MICHAELIS: DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA PORTUGUESA. Disponível em:
<https://michaelis.uol.com.br/palavra/la9ld/ninfagogo/>. Acesso em: 01 mai. 2021.
VAN GRONINGEN, Gerard. Criação e Consumação. 2ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2017, v. 1.
WESTERMANN, Claus. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Paulinas, 1987

FONTE: IGREJA PRESBITERIANA DE RIBEIRÃO PRETO -SP-BRASIL

 

Redação Portugal

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